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Memória de Santarém – A tragédia de Santarém

Lúcio Flávio Pinto - 27/12/2021

Reproduzo, a seguir, na íntegra, matéria publicada pelo Correio da Manhã, do Rio de Janeiro, de 21 de fevereiro de 1969, cinco meses depois do conflito sangrento que estourou em Santarém, com três mortos e cinco feridos. Uma tropa com 150 soldados da Polícia Militar (deslocada de Belém por ordem do governador Alacid Nunes) impediu que uma passeata, com cerca de cinco mil participantes, conduzisse de volta à prefeitura Elias Pinto (do MDB, partido de oposição no sistema bipartidário implantado pelo regime militar).

 

O prefeito, afastado do cargo pela maioria dos vereadores municipais, do partido do governo, a Arena, conseguira um mandado de segurança concedido pelo juiz (depois desembargador) Christo Alves para ser reintegrado ao comando de Santarém. Como o governador reagisse contra essa determinação, uma passeata foi organizada para o cumprimento do mandado judicial. No conflito, o deputado federal da Arena (e brigadeiro da reserva) Haroldo Veloso, que liderava a manifestação, foi morto, vindo a morrer depois.

 

Escrevi em 2018 um livro  sobre o episódio: A tragédia de Santarém (Prelúdio do AI-5 na Amazônia).

 

GAMA E PASSARINHO VEEM INTERVENÇÃO FEDERAL: SANTARÉM

O ministro Jarbas Passarinho, do Trabalho, afirmou, ontem, haver solicitado a intervenção federal no Município de Santarém, no Pará, mantendo, pela manhã, uma demorada conferência com o ministro da Justiça, que se mostrou sensível à tese da intervenção. O ministro Passarinho, ex-governador do Pará, explicou que, ao sugerir ao ministro Gama e Silva a intervenção, federal em Santarém, onde sábado foi assassinado o prefeito em exercício Elinaldo Barbosa, teve como objetivo evitar que novos acontecimentos sangrentos venham a ocorrer. Disse: "Acho que é necessária, ao apaziguamento, a nomeação de um homem de fora, com autoridade”.

Afirmou o ministro do Trabalho que, em consequência do afastamento do prefeito Elias Pinto e do vice-prefeito de Santarém, sr. Elinaldo Barbosa [Joaquim Martins], o 1° secretário da Câmara dos Vereadores passou a ocupar a Prefeitura. Já era prefeito quando, em setembro, ocorreram os episódios que envolveram o brigadeiro e deputado [federal] Haroldo Veloso.

MORTE

O autor do assassinato, Severino Frazão, era administrador do mercado. Fora colocado em disponibilidade, pelo prefeito anterior, devido ao seu estado de saúde. O prefeito Elinaldo Barbosa, ao assumir a Prefeitura, manteve a disponibilidade. Quinta-feira, na semana do carnaval [13 de fevereiro] Severino Frazão procurou o prefeito para saber a data de seu pagamento. O prefeito explicou-lhe que, na quinta-feira, era o pagamento do pessoal interno. Sábado, seriam pagos os diaristas, e, na segunda-feira, o pessoal externo, lote em que se achava o administrador em disponibilidade

No enterro, no ministério do Trabalho, o prefeito Elinaldo Barbosa estava pacificando a política do segundo maior município em importância do Estado do Pará e possivelmente seria eleito prefeito em março, em virtude, do afastamento definitivo-do prefeito Elias Pinto.

Severino Frazão, porém, não esperou. Sábado, entrou na Prefeitura, armado de dois revólveres. Gritou: "Vim buscar o meu dinheiro"; e, em seguida, atirou no prefeito, atingindo-o, mortalmente, na cabeça. Quando o prefeito caiu, o assassino descarregou ainda a arma, ferindo, na mão, o tesoureiro do município. Imediatamente o criminoso fugiu, por interferência do pároco local.

A casa do padre foi cercada por populares. Um soldado e um sargento da Polícia Militar invadiram-na, pelos fundos. Foram, então, ouvidos disparos de arma de fogo. O padre abriu a porta e saiu dizendo: "Já fizeram o que queriam." Logo apareceu, o sargento, explicando, nervosamente: "ele reagiu." O ministro d0 Trabalho declarou ontem, no Rio, em entrevista coletiva: "Tudo leva a crer que foram disparados dois tiros para o chão, perto dos pés do criminoso, e, como este reagisse, foi ferido, mortalmente, no ventre. O ministro acredita que os policiais não tiveram a intenção de matar o assassino do prefeito, "pois, se assim desejassem, não iriam primeiro disparar dois tiros para o chão". O assunto será objeto de rigoroso inquérito mandado instaurar pelo governador do Estado.

 

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